Mais do que lutar, o Karatê tem como intuito
desenvolver mente e corpo em estado de equilíbrio e aperfeiçoar o caráter dos
praticantes. Há quatro anos, o professor do estilo Shotokan, Teófilo Piau,
adaptou o esporte para cadeirantes, nas cidades de Patos de Minas e Presidente
Olegário. A iniciativa ganhou espaço e, além de diminuir preconceitos, motivou
ainda mais os atletas que não têm deficiência.
“A ideia veio na época em que eu cursava educação
física e fiquei interessado pela matéria sobre portadores de necessidades
especiais e resolvi adaptar a técnica à realidade deles”, disse Piau.
Apesar dos alunos serem cadeirantes, o professor
ministra quase toda a aula em pé. Alguns movimentos ele faz sentado para sentir
as limitações dos alunos. “É muito gratificante, pois, a garra que eles têm e a
vontade de superar obstáculos é enorme. Eles são um estímulo para os outros
atletas de competição, devido a grande vontade e dedicação que têm para
aprender”, contou Teófilo.
O técnico da Seleção Mineira de Karatê, de
Uberlândia, Roney Vitor, acredita que o esporte traz uma transformação social e
educacional com base no poder de superação. A modalidade para cadeirantes ainda
é nova no Brasil, porque há poucas academias que atendem pessoas com
deficiência. Contudo, uma prova de que a modalidade conquista espaço foi a
aceitação da Federação Mineira de Karatê (FMK) em incluir disputas da categoria
Portador de Necessidade Especiais (PNE) em seu calendário oficial de
competições. A categoria especial e conta pontos para o ranking oficial.
“As principais mudanças foram a adaptação e a
integração entre atletas de alto rendimento, pais e amigos junto aos atletas
PNE. Eles aprenderam competir e passaram a vivenciar o espírito de equipe e o
prazer da competição, seja na vitória ou na derrota. As atividades marciais são
uma alavanca no ensinamento de superação de desafios. O ato de vencer está em
superar nossas próprias limitações”, disse Roney.
Com a dor veio a oportunidade
Edvaldo Roberto Gonçalves, natural de Patos de
Minas, não imaginava que seria carateca quando há quase sete anos caiu do
quinto andar de um prédio. Ele trabalhava como pintor e com a queda teve lesões
nas pernas e coluna, ficando com paraplegia parcial. Após o trauma, o atleta
que hoje tem 32 anos praticou basquete para cadeirantes, mas descobriu no
karatê uma verdadeira paixão.
“Eu jogava apenas o basquete sobre rodas em uma
universidade da cidade quando o Sensei Teófilo me apresentou a modalidade. Eu
gostei, pratico há cerca de quatro anos e estou indo bem melhor do que eu e ele
imaginávamos. Não acreditava que cadeirantes podiam praticar o esporte até ser
apresentado a ele”, comentou.
Edvaldo ganhou no total, 16 medalhas e dois
troféus, sendo que três medalhas e os troféus vieram por sua dedicação e
esforço nos exames de faixa. As demais foram conquistadas em campeonatos
mineiros, na modalidade kata, que é a execução dos movimentos de luta.
“A união e a confraternização entre os atletas me
fizeram ver a vida de outra forma. Eu melhorei a minha autoestima, coordenação
motora e adquiri respeito por parte da minha família e da sociedade. Hoje, o
meu maior prazer é seguir em frente lutando e correndo atrás do que é melhor
para o bem de todos e ajudando aqueles que me cercam”, concluiu.
O colega de Edvaldo, Daniel Silva, é karateca há
nove anos. Apesar da experiência, ele disse que aprendeu com as limitações do
amigo e que vê nele um atleta inspirador. “É legal porque ele mostra que todos
temos dificuldades e que estas podem sim ser superadas. A coragem e dedicação
destes atletas refletem no nosso treino e dia a dia, pois, vemos que tudo
depende, apenas, da força de vontade”, afirmou Daniel.
A modalidade tem dado tantos resultados que o
trabalho do professor Teófilo Piau vai ser contado em um livro. A obra fala
sobre pessoas com necessidades especiais que praticam algum esporte, em
especial o karatê.
Edvaldo participou da 17ª Copa João Carlos de Godói,
ocorrida em Ubá/MG, nos dias 21 e 22 de setembro. Ele participou da modalidade
Kata e recebeu medalha de ouro no evento.