segunda-feira, 28 de março de 2011

O INÍCIO DO KARATE NO BRASIL

Como o Judo, o Karate também chegou ao Brasil com os primeiros imigrantes japoneses no ano de 1908 e se instalou primeiro em São Paulo, principalmente nas cidades do interior. Foi introduzido através das colônias japonesas nas cidades de Biguá, Pedro de Toledo, Bastos, Maria e Garça, além do litoral e da capital paulista. Durante vários anos, os imigrantes japoneses ensinaram a “arte da mão vazia” aos jovens japoneses e aos poucos brasileiros que se interessavam.

“Marco inicial do Karate no Brasil” -  Mestre Sadamu Uriu 

“Buscar nas tradições do passado, inspiração para a evolução no futuro”

Mestre Sadamu Uriu 8º Dan – Japan Karate ShotoFederation – JKS 

O karate, arte marcial japonesa, é praticado por pessoas de todas as idades em todas as regiões do Brasil. Entre os seus admiradores e praticantes estão profissionais liberais, professores, estudantes, empresários, donas-de-casa e pessoas com as mais diversas ocupações. Podem ser encontradas nas academias e competições de karate crianças, adolescentes, adultos e idosos, de ambos os sexos.

O Dojo é sagrado para os praticantes de artes marciais

De todos é possível ouvir comentários e histórias sobre a influência positiva que o karate teve e tem em suas vidas. Não faltam casos de crianças muito tímidas excessivamente agressivas que encontraram no karate uma referência para a busca do equilíbrio. São freqüentes os exemplos de pessoas que começaram a praticar o karate já na maturidade e nele encontraram uma fonte para a manutenção ou recuperação de algumas características de sua juventude.

Sem que muitos saibam, existe uma pessoa que teve e tem grande influência na vida de todos eles, o Shihan (Mestre) Sadamu Uriu, que completou 78 anos em 2007. Vindo como imigrante do Japão em 1959, Mestre Uriu foi um dos introdutores do karate no Brasil e sua história se confunde com a do próprio karate brasileiro.

Nas linhas seguintes encontra-se um pouco da história desse Grande Mestre, acompanhado de parte da história do karate no Brasil. Esse conhecimento deve servir de estímulo adicional para todos os praticantes e admiradores do karate.

Sadamu Uriu nasceu em 20 de setembro de 1929 no Japão, em Fukuoka-Ken, na ilha de Kyushu, na região sul do Japão, situada a aproximadamente 1500 quilômetros de Tóquio. A região, naquela época essencialmente agrícola, hoje tem suas atividades econômicas concentradas na mineração, siderurgia e construção naval.

Desde o nascimento, mestre Uriu parecia destinado a ter sua vida associada às artes marciais. Seu pai, Seizaburo Uriu, além de agricultor era praticantes de judo. Sua mãe, Tsuwako Uriu, teve cinco filhos, três homens e duas mulheres, todos ainda vivos, sendo Sadamu Uriu o quarto a nascer. Seus dois irmãos homens eram faixas-pretas de Kendo (luta com espadas) e participaram da Segunda guerra Mundial. Um deles era oficial do exército e o outro policial de um grupo de elite.

Sadamu Uriu começou a estudar aos sete anos de idade e cursou o ensino fundamental e médio, equivalentes ao 1º e 2º graus brasileiros na própria ilha de Kyushu, nas escolas Dairi-Sho e Mojishogio. Esta formação escolar no Japão tinha a duração de dez anos e durante o 2º grau Mestre Uriu praticou Kendo.

Nesta época o Japão sofreu os efeitos da Segunda Guerra Mundial e os jovens tinham que contribuir para o esforço de guerra. Em 1945, aos 16 anos, Sadamu Uriu foi para a Escola de Formação de Pilotos da Marinha. O final da guerra impediu que ele fosse enviado para a frente de combate.

Age Uke

Em 1951, aos 22 anos, Sadamu Uriu foi para a Universidade Takushoku, em Tóquio, onde já estudava um de seus irmãos. Lá, além de se formar em Economia, iniciou o seu treinamento em Karate. Naquela época, no Japão, era nas faculdades que se iniciava o aprendizado do Karate, ao contrário da prática atual, em que mesmo crianças iniciam o seu treinamento em academias especializadas. Seu professor foi o famoso Mestre Nakayama, que por sua vez fora discípulo do lendário Mestre Gichin Funakoshi, fundador do estilo Shotokan de Karate e seu divulgador em todo o mundo.

Nessa época havia treinamento de Karate, mas não existiam graduações por faixa nem competições, que só surgiram após a criação, em 1954, da Nihon Karate Kyokai (atualmente Japan Karate Association – JKA). Mestre Uriu graduou-se em karate (faixa-preta) pela JKA.

Na Universidade Takushoku praticaram Karate com Mestre Nakayama três outros mestres importantes do Karate, que acabaram também vindo para locais diversos no  Brasil: Higashino, no Distrito Federal, Tanaka, no Rio de Janeiro e Sagara, em São Paulo.

Formado em Economia, Sadamu Uriu deparou-se com a extrema dificuldade de conseguir emprego, decorrente da destruição de parte importante da economia japonesa durante a guerra. Ele chegou a pensar em imigrar para a Indonésia, seguindo seu amigo Habu, que hoje é professor universitário lá. Mas o mesmo Habu lhe falou sobre o Brasil e as possibilidades de trabalho aqui, acabando por convencê-lo a tentar a vida em nosso país.

Assim, em 30 de dezembro de 1958, Mestre Uriu embarca, sem nenhum acompanhante, no navio Maru para o Brasil, um navio do governo japonês destinado para pessoas que desejassem emigrar para o Brasil. Nessa época, o governo japonês mantinha contatos com japoneses já estabelecidos no Brasil e que precisassem de mão-de-obra.

A viagem dura 45 dias e Sadamu Uriu desembarca no porto de Santos/SP, dirigindo-se em seguida para Pindamonhangaba/SP, para trabalhar na atividade agrícola na fazenda de Yoshio Igarashi. Lá ele permanece três meses e conhece D. Aurora, uma das filhas do Sr. Yoshio, que viria, mais tarde, a ser sua esposa.

De Pindamonhangaba/SP, Sadamu Uriu vai para a capital, São Paulo, para trabalhar na fábrica da Toyota, primeiro na linha de montagem e depois na área administrativa. O então presidente da Toyota, Sr. Kiyoyasu Koide, que o contrata também formara-se na Universidade Takushoku. O mais curioso, e um sinal adicional de que a vida de Sadamu Uriu estava definitivamente associada às artes marciais, é que o presidente era faixa-preta de 5º Dan de Judo e acabaria sendo seu padrinho de casamento.

Na Toyota, Sadamu Uriu permanece dois anos, 1960 e 1961, tendo como colega de trabalho, outro mestre importante do Karate, Yasutaka Tanaka, que deixara o Japão um mês depois de Uriu e, através da troca de cartas, viera se juntar a ele no trabalho na agricultura. A amizade que uniu esses dois mestres atravessou o mar e o tempo e permanece até os dias de hoje.

DOJOKUN

Já estabelecido em São Paulo, Sadamu Uriu começa a se reunir com alguns de seus ex-colegas da faculdade de Takushoku no Japão, também imigrantes, para treinar karate. Entre eles estavam os mestres Tetsuma Higashino, Yasutaka Tanaka e Juichi Sagara. Naquela época não havia ainda a intenção de abrir academias para ensinar o karate. Atualmente, Uriu e Tanaka vivem no Rio de Janeiro e ensinam a arte do karate a todos que os procuram. Sagara falecido em 2001 ensinava em São Paulo e Higashino falecido em 1987 ensinava em Brasília.

Em 1961 Lirton Monassa (falecido em 2000) procurou Uriu e Tanaka em São Paulo para que se transferissem para Rio de Janeiro para ensinar o karate, o que eles fazem em 1962, quando passam a lecionar na academia Kobukan, no bairro de Botafogo/RJ.

É também em 1962, no dia 29 de setembro, que Sadamu Uriu, nesta época residindo em Duque de Caxias/RJ, se casa com a Sra. Aurora Uriu. Deste casamento nascem dois filhos, Cezar e Cid, ambos praticantes de karate desde a infância. Cid Uriu é atualmente engenheiro da Petrobrás, trabalhando na base de extração de petróleo da cidade de Macaé, situada no litoral norte do estado do Rio de Janeiro. Cezar Uriu é engenheiro mecânico, empresário e faixa-preta de 5º Dan, ocupando atualmente a presidência da Confederação Brasileira de Karate Shotokan (CBKS), fundada por Mestre Sadamu Uriu em 1994.

Após o início em 1962 na academia Kobukan, Mestre Uriu passa, em 1963, a lecionar karate três vezes por semana no Tijuca Atlético Clube, para um grupo de 30 alunos. Nessa época, apareceram para assistir a um treino os tenentes Pacheco e Valporto, que impressionados com a técnica do karate convidaram Mestre Uriu para fazer uma demonstração no Batalhão de Infantaria-Paraquedista.

Mestre Uriu faz, então uma apresentação de karate no Batalhão de Infantaria e pede-se a ele que faça uma demonstração de luta, primeiro contra um soldado boxeador e depois contra um soldado capoeirista. Ele vence as duas e um novo desafio lhe é apresentado: colocado diante de pilhas de madeira e de tijolos, perguntam se seria capaz de quebrá-los. Ele assim faz, para espanto e admiração de todos, e a partir daí começa a ensinar karate no Batalhão de Infantaria, onde ficou por 15 anos, até 1978. No meio militar, Mestre Uriu foi também instrutor da Escola de Comunicação do Exército (1964 a 1967) e da Escola Militar no Forte do Leme (1965 a 1967), todos no Rio de Janeiro.

Em 1964, alguns alunos e admiradores ajudam Mestre Uriu a montar a academia Shidokan, na Usina/RJ. Com a formação de vários atletas faixas-pretas pelo Mestre Uriu, na Shidokan, e pelo Mestre Tanaka, na Kobukan, começam a surgir diversas academias, expandindo-se, assim, o karate no Rio de Janeiro.



De 1973 a 1985, Mestre Sadamu Uriu foi também instrutor da Universidade Gama Filho, no Rio de Janeiro.

Ao longo das décadas de 60, 70 e 80, alguns marcos na história do karate brasileiro merecem registro, tais como:

1964 – com o karate no Rio de Janeiro filiado à Federação· Carioca de Pugilismo, realiza-se o 1º Campeonato Carioca de Karate. Após este campeonato, o karate em diversos estados filia-se às respectivas federações de pugilismo;

1968 (a 1970) – Mestre Uriu introduziu o Karate no estado· da Bahia, sendo, neste período, técnico da seleção baiana;

1969 – realizado pela Confederação Brasileira de· Pugilismo o 1º Campeonato Brasileiro de Karate, no Rio de Janeiro, com o auxílio dos mestres Uriu e Tanaka. O Rio de Janeiro conquista o 1º lugar, ficando o 2º com São Paulo e o 3º com a Bahia;

1970 – participação no 1º Campeonato Mundial, realizado· no Japão;

1972 – participação no 2º Campeonato· Mundial, realizado na França;

1975 – o Mestre Uriu, trás pela primeira vez ao Brasil o· Mestre Masatoshi Nakayama. Nesta ocasião o Mestre Nakayama ministra um curso de aperfeiçoamento técnico no Rio de Janeiro.

1978 – participação no 1º Campeonato Pan-americano, no· Peru, neste mesmo ano o Mestre Uriu trás para o Brasil o Mestre Tetsuhiko Asai. A partir desde momento se inicia uma amizade que perdura até os dias de hoje;

1988 – 1º Campeonato Sul-americano de Karate, com o· Brasil sagrando-se campeão;

1989 – o Brasil vence o Campeonato Pan-americano,· realizado na Venezuela.

Em 1990 o Brasil conquista o bi-campeonato no 2º Campeonato Sul-americano de Karate e o vice-campeonato no 7º Campeonato Pan-americano de karate. Em 1991, o Brasil conquista o Campeonato Sul-americano, realizado no Paraguai, e o 5º lugar no Mundial do México. Em 1993, consegue o 3º lugar no Mundial da África do Sul.

Durante muitos anos, Mestre Sadamu Uriu foi o técnico da seleção brasileira, contribuindo para firmar o nome do Brasil no karate internacional. Foi, também, técnico da seleção carioca, aperfeiçoando o karate no estado do Rio de Janeiro. Em 1991 ele foi o coordenador técnico do 1º Congresso Brasileiro de Professores de Karate.

Embora importante e necessária, a forte expansão do karate no Brasil nas décadas de 70 e 80 gerou, no final dos anos 80 e início dos anos 90, conflitos de interesse e até mesmo um certo afastamento dos seus princípios e da sua essência. A conseqüência disto foi a perda de uma parte dos seus adeptos e, de certa forma, da própria força do karate brasileiro.

Preocupado com esta situação, em 1994, Mestre Sadamu Uriu funda a Confederação Brasileira de Karate Shotokan – CBKS, com o objetivo de trabalhar pelo desenvolvimento do karate sem interesses econômicos, políticos e de poder. Todo o esforço foi concentrado na formação técnica dos praticantes e na divulgação do verdadeiro caminho do karate.



Coerente com esses objetivos, a CBKS foi organizada seguindo alguns princípios:

– Sistema democrático de gestão, com a diretoria tendo mandato de dois anos e sendo escolhida em eleição direta pelos filiados na Assembléia Geral Ordinária. Todas as demais decisões importantes são também tomadas pela Assembléia Geral Ordinária.

– A diretoria não recebe qualquer espécie de remuneração, fixa ou variável;

– Um Conselho de Ética zela pelas questões e princípios fundamentais do karate;

– Não depende de nenhuma verba governamental ou empresarial para o exercício de suas atividades básicas. Todos os recursos são originados dos atletas e federações filiados;

– Todos os recursos e os eventuais superávits obtidos são reinvestidos no desenvolvimento do karate brasileiro.

O Shihan Sadamu Uriu, que possui o 8º Dan, ocupa a posição de Presidente de Honra da CBKS e, desde a sua fundação, tem visitado todas a regiões do Brasil ministrando cursos de aperfeiçoamento para atletas e professores, qualificando árbitros para competições e supervisionado tecnicamente os campeonatos estaduais. Para assegurar a qualidade técnica dos filiados à CBKS, apenas o Shihan Uriu ministra os exames para faixa-preta. A CBKS está também depurando e organizando um cadastro de instrutores faixas-pretas qualificados para o ensino do karate, contribuindo para a plena aplicação da legislação do Conselho Federal de Educação Física sobre o assunto.

Fiel ao objetivo de aperfeiçoar continuamente o karate brasileiro, a CBKS, nos 12 anos de sua existência, trouxe ao Brasil 7 diferentes mestres japoneses, para ministrarem cursos de especialização e supervisionarem as competições de âmbito nacional. Foram eles os mestres Asai, Kato, Watanabe, Miura, Sato, Kaneko e Katsuno.

No nível internacional, a CBKS é filiada a International Japan Karate Association – IJKA e à Japan Karate ShotoFederation – JKS, lideradas pelo Mestre Tetsuhiko Asai-9º Dan. A IJKS possui registro no governo japonês como instituição cultural e esportiva, sendo pioneira no ensino do karate para deficientes físicos.

A criação da CBKS foi o inicio de uma série de eventos importantes para o karate no Brasil, promovendo diversos campeonatos a nível municipal, estadual por todo o Brasil e Campeonatos Brasileiros, além de curso dos mais diversos níveis, participação em Campeonatos mundiais e sul-americano.

1998 – Mestre Uriu sofre um terrível acidente automobilístico no estado de Rondônia, onde fora ministrar curso de aperfeiçoamento técnico e exame de faixa, além de supervisionar o campeonato estadual. Tendo desembarcado no aeroporto de Vilhena/RO, ele estava sendo conduzido de carro para a cidade de Alta Floresta D’Oeste/RO. Na altura do município de Santa Luzia D’Oeste/RO o motorista cochila e o carro despenca em um abismo. Mestre Uriu fica entre a vida e a morte e, cessado o risco de vida, é transportado de avião para o Rio de Janeiro. Lá, sucedem-se muitos meses de internação no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO), acompanhados de 9 cirurgias. A tragédia, que teria encerrado a carreira esportiva de qualquer pessoa comum, foi encarada pelo Mestre Sadamu Uriu como mais um desafio a vencer. Foram meses de fisioterapia, de convivência com fortes dores, de deslocamento em cadeira de rodas e, posteriormente, de muletas. Mas o mestre do karate decidiu dar mais uma lição a si mesmo e a todos os praticantes das artes marciais. Enfrentou todas as dificuldades já em 1999 voltava ao convívio dos alunos e professores, preparando o corpo e o espírito para voltar a praticar e ensinar o karate. Enquanto isso, seu filho mais velho, Cezar Uriu, 5º Dan, que já retornara após 4 anos vividos no Japão, assume a responsabilidade de conduzir os cursos, exames e campeonatos, até o restabelecimento pleno de Mestre Uriu;

Em 2000, por ocasião da participação do Brasil no Campeonato Mundial na Hungria. Mestre Sadamu Uriu, já quase totalmente recuperado, chefia a delegação brasileira que vai à Hungria e, em novembro, vai ao Japão para acompanhar o campeonato nacional japonês, na ilha de Hokaido, norte do Japão, e participar da reunião dos mestres da IJKA. Neste ano, Mestre Uriu é nomeado pelo shuseki Tetsuhiko Asai (falecido em 2006) responsável pelas atividades da IJKA e da JKS na América do Sul.

Tendo liderado momentos importantes da introdução, consolidação e desenvolvimento do karate brasileiro, além de participar dos eventos internacionais importantes, Mestre Sadamu Uriu não perdeu a simplicidade que sempre recomenda aos praticantes do karate.

Ele pode ser encontrado todos os dias, desde 1976, lecionando karate na academia NKK, na rua Félix da Cunha 65, bairro da Tijuca, estado do Rio de Janeiro, acompanhado por seu filho mais velho, Cezar Uriu – 5º Dan, sua esposa Aurora Uriu e seus Shidoins (instrutores), Veriano Dovalski – 3º Dan, Wilson Serzedelo – 3º Dan, Diogo Yoshida – 4º Dan, Rodolfo Ferreira – 4º Dan e Celso Lemme – 2º Dan.

A NKK se tornou uma referência para todos os que praticam karate no Rio de Janeiro e no Brasil e conserva a aparência e o espírito dos dojos japoneses tradicionais. Lá é a segunda casa de Mestre Uriu, que está sempre aberta a todos que se interessam pelo karate.

terça-feira, 22 de março de 2011

A história das artes marciais e o surgimento do Karatê - Parte II

História do Karatê
O Karate teve como berço à ilha de Okinawa, no arquipélago de Riu-Kyu, ao sul do Japão. No final da dinastia Ming, Okinawa passou a ser dominada pelo Japão que, para evitar a reação do povo nativo proibiu o uso de armas. Sob pressão militar, a população buscou, nos utensílios de uso cotidiano e no próprio corpo, meios de defesa (Nakayama, 1987). Surgiram então os primeiros indícios da arte marcial no início chamada de “tode”. Devido à sua localização geográfica, Okinawa recebia comerciantes e visitantes de várias partes do continente. Nessa época, o “tode” (karatê primitivo) era influenciado pelas artes de luta praticadas principalmente na China.
O alvorecer do século XX trouxe consigo o deslocamento do enfoque de luta de sobrevivência para educação física com fundamentação espiritual. O karate deixou de ser ensinado apenas de modo secreto e, em 1916, mestre Funakoshi fez a primeira demonstração pública fora de Okinawa. Mestre Funakoshi é considerado o pai do Karate moderno, por tê-lo aperfeiçoado técnica, literal e filosoficamente (Nakayama, 1987). Ele viajou por todo o Japão e foi convidado a lecionar em Universidades, onde o Karate passou a ser submetido à pesquisa científica, aprimorando técnicas e criando métodos de treinamentos sistemáticos (Silvares, 1987).
Gishin Funakoshi - Criador do Karatê Shotokan

Após o sucesso de Funakoshi, outros mestres de Okinawa foram ao Japão divulgar os seus estilos de Karate. Segundo Okinawa (1985), a fusão do karate com a concepção japonesa de Arte Marcial deu origem a quatro estilos principais conhecidos hoje: Shotokan (Funakoshi), Shito-riu (Mabuni), Goju-riu (Miyagi) e Wado-riu (Otsuka). Após a segunda guerra mundial, a emigração dos japoneses e o grande interesse das tropas de ocupação em aprenderem a lutar, difundiram o karate pelos continentes. Hoje o Karatê, segundo a WKF, é a Arte Marcial mais praticada no mundo.
A ORIGEM DAS ARTES MARCIAIS
Os primeiros indícios de Artes Marciais surgiram no Oriente, muito antes da invenção da escrita. Acredita-se que as técnicas de defesa e ataque tiveram origem na observação dos animais na natureza, partindo da necessidade de sobrevivência e obtenção de alimentos. Nos antigos templos, os monges desenvolveram técnicas de luta sem armas, objetivando saúde e autodefesa, onde, “através de exercícios penosos pretendiam o fortalecimento do corpo para dar morada à paz de espírito e à verdade religiosa” (Sasaki, 1989). As artes marciais foram ensinadas em segredo de mestre para discípulo por séculos, por isso há grande falta de literatura apropriada que descrevam com exatidão a sua história.
A CONTRIBUIÇÃO DA ÍNDIA
Na antiga Índia, há mais de 5000 anos a.C. surgiu uma luta marcial cujo nome em Sânscrito era “Vajramushti”, a tradução literal significa “punho real”, ou “aquele cujo punho cerrado é inflexível”. Era uma arte guerreira, desenvolvida pela casta marcial da Índia chamada Dshastra. Uma Arte Marcial que se desenvolveu simultaneamente com práticas de meditação e estudos dos antigos clássicos da Índia, como os Veda, Gita e os Purana. Tinha por objetivo o desenvolvimento espiritual, físico e de defesa pessoal. Nas origens do Budismo era ensinada junto com as técnicas de meditação Sakiamun.
O Buda era um príncipe e como tal pertencia à classe guerreira dos Dshastras, assim aprendeu o Vajramushti como parte de sua educação militar. Mais tarde, também como guerreiro, ensinava o Vajramushti, visando a unificação da mente com o corpo. Embora Buda o ensinasse como uma prática ascética, que visava a vivência dos preceitos budistas, os monges que se tornaram seus discípulos o apreciavam também como um recurso para a defesa pessoal para enfrentar os perigos daqueles tempos em suas peregrinações.
Quase mil anos depois da morte de Buda, Bodhidharma, que era filho do Rei Sughanda e, portanto, príncipe, aprendeu o Vajramushti de um velho mestre chamado Prajnatara. Tendo se tornado o 28º patriarca do Budismo, viajou à China a convite do Imperador, Lin Wu Ti, que era um admirador do Budismo. Porém, Wu Ti era seguidor de uma linha nova no Budismo, com características ritualísticas e salvacionistas, contrárias às de Bodhidharma, que pregava a meditação e a busca interior. Por esta razão ele viajou ao vizinho reinado de Wei e hospedou-se no Templo Shaolin.
Valorizando o Vajramushti como auxiliar do homem em sua pesquisa interior, os monges budistas se desenvolveram enormemente nesta Arte Marcial e o Templo Shaolin ficou mais famoso como centro de Artes Marciais do que de budismo, efetivamente. O Vajramushti era, no Templo Shaolin, ensinado em segredo, devido ao seu poder como Arte Marcial, e as técnicas somente eram ensinadas às pessoas que entendessem o conhecimento de seu verdadeiro significado.
Com o tempo ocorreu uma cisão nos propósitos do Templo. Conhecimentos de Vajramushti adicionados ao Kung-Fu antigo, originado dos tempos de Huang-Ti, eram ensinados ao povo com nome de Kung Fu Shaolin, com o objetivo de se defenderem do domínio dos oficiais corruptos do governo Manchu. Mas entre os monges Shaolin mantinha-se preservado o verdadeiro Vajramushti, que como recurso à meditação e ao desenvolvimento do espírito passou a ser chamado em chinês “Ch'an Tao Chuan”, ou “A arte dos punhos no caminho da meditação”.
A CONTRIBUIÇÃO DA CHINA
Aproximadamente no ano 2600 a.C. surgia uma forma de combate individual chamado de Go Ti, que teria sido criado por um “Senhor da Guerra” chamado Chi-Yu. Durante os turbulentos séculos VII e VIII a.C. foi escrito no livro “I Ching” que: “Sem as técnicas de luta, um homem é relegado ao posto mais baixo do exército”. Enquanto isso, uma outra forma de evolução acontecia. Monges eruditos descreviam uma série de antigas ginásticas medicinais. Estes exercícios combinavam movimentos e posturas físicas com a respiração para purificar o corpo e o espírito.
O primeiro acontecimento de realce, no começo do século VI, foi o pronunciamento de Confúcio sobre a necessidade de se cultivar as Artes Marciais. A seguinte grande influência na arte aconteceu em torno do ano de 520 d.C., com a chegada do monge budista Bodhidharma, que viera da Índia. Sua chegada trouxe mudanças significativas, influenciando os hábitos não só dos monges como de toda a comunidade.
O conceito de “mente vazia” e outras formas de estilo Zen eram rapidamente incorporadas à arte. Após a morte de Bodhidharma, por volta do ano de 557 d.C., a Arte de Shaolin começou a tomar forma de luta, sendo mais tarde denominado “Shaolin su Chuan-Fa”. Apesar de existirem na China inúmeros estilos de Kung-Fu, a linha de Bodhidharma foi a mais significativa para a evolução do ser humano, influenciando até hoje inúmeros atletas e Artistas Marciais. “Lutar e vencer todas as batalhas não é a glória suprema. A glória suprema consiste em quebrar a resistência do inimigo sem lutar”. Zun Tzu

O JAPÃO E AS ARTES MARCIAIS
As Artes Marciais Japonesas podem se dividir em três períodos: O período do Bujitsu, o do Bugei e o do Budô. No tempo do Bujitsu, existiam as técnicas primitivas de luta que eram usadas nas constantes guerras. Durante o século VII o Japão começou a assimilar a Cultura chinesa, utilizando a sua escrita e seu sistema hierarquizado, surgindo as classes militares. O príncipe Imperial Shotoki Taichu (595 – 621) favoreceu a expansão do Budismo e encorajou a penetração da cultura chinesa no país.
Esta política possibilitou uma verdadeira reforma na administração e nas instituições. O período termina no final do século VIII com o florescimento da civilização de Nara, a primeira capital do Império Japonês. O período Bugei surgiu em conseqüência da necessidade de defesa militar. As práticas Marciais foram mais desenvolvidas, surgindo várias escolas (ryu) e os primeiros mestres conhecidos. Com o estabelecimento do Xogunato, de 794 a 1615, iniciou-se a transferência da capital para Quioto.
É nesta época do século IX e início do século X que enfraquece a autoridade Imperial e, em 1185, a família Minamoto toma o poder. Verdadeiras dinastias de Xoguns tomaram nas mãos o destino do país. Período este que se estendeu até a dominação dos Tokugawa em 1603. Na era Iedo de 1615 a 1868, com os Tokugawa, transferiu-se a capital para Edo, a atual Tókio. No período do Budô, o Shogun, Ieyasu Tokugawa, estabeleceu o seu governo em Edo.
Com poder imenso, instituiu-se no governo passando-o para seus descendentes e trazendo um longo período de paz e tranqüilidade, graças à obediência que exigia dos chefes. Com o domínio Tokugawa, o Bugei passou a ser usado mais como um princípio de educação e ética para se atingir um elevado estado de espírito. A partir daí, a maior razão das Artes Marciais Japonesas passou a ser o aperfeiçoamento dos próprios praticantes. Surge então o Budô (O Caminho do Guerreiro). Os mestres japoneses, temendo talvez o contato com o Ocidente e o choque do mundo moderno, quiseram colocar como importância essencial o Caminho (Dô), trocando os antigos nomes dos bujitsu, tais como ju-jitsu, aiki-jitsu, etc, para judô, aikidô, etc.
Desta maneira esperavam que o grande público não confundisse as artes marciais com os esportes de combate e que o sentido do “Caminho” não se perdesse nos meandros da história. O Budô é a continuação do Bujitsu em dois sentidos: para alcançá-lo e para que ele nos alcance. A busca técnica efetuada desde tempos remotos, pelos Mestres japoneses, se baseou sempre nos princípios de relações complementares que regem o universo. O jogo de forças ativas (yang) e passivas (yin) é posto em prática com uma precisão extraordinária nos movimentos de ataque e de defesa, de maneira que se possa neutralizar o adversário com um mínimo de esforço e um máximo de eficácia.
A INTRODUÇÃO DO KARATE NO JAPÃO
O Karate foi introduzido no Japão na década de 1920. Nessa época, o Karate não tinha, até então, um método de ensino formal e padrão, sendo ensinado por cada mestre segundo o seu gosto particular. Mas para que essa arte vinda da ilha de Okinawa pudesse ser aceita pela sociedade e a cultura japonesa, algumas coisas precisaram ser modificadas. O significado do ideograma (símbolo da escrita japonesa) “Kara”, significava “Chinesa”.
O Tigre - Símbolo do Karatê Shotokan

O karate então se traduzia por “mãos chinesas”. Mas ao longo da história, Japão e China haviam entrado em guerra muitas vezes, por isso o povo japonês não aceitaria algo que pudesse lembrar a China. Então mestre Funakoshi trocou o significado da palavra “kara”, já que os ideogramas japoneses podem ser lidos de duas maneiras (“kun” e “un”) segundo o seu significado ou segundo a sua pronúncia.
O ideograma com a mesma pronuncia “Kara”, com novo significado que não “chinesa” tem origem no termo Sunya ou Sunyata do sânscrito que significa “zero”, “vazio”, e é muito usado na tradição Zen-Budista. Vários dos mestres que queriam introduzir o Karate-Jutsu no Japão decidiram adotar este outro símbolo e também trocaram a expressão “jutsu” (técnica ou arte) por “Do” que deriva da palavra chinesa “tao” (via, caminho). Este nome pareceu, então, apropriado já que descreve uma arte de luta sem armas e também duas características importantes do Zen-Budismo: a “mente vazia” (sem preocupações, ódio, inveja ou desejo) e o “caminho”, a “via” que devemos transitar para chegar a esse estado de iluminação.

Por influência de Jigoro Kano (criador do Judô), que era seu amigo, mestre Funakoshi também adotou o karate-gui, o uniforme branco, e o sistema de faixas e graduações de Kyus (faixas coloridas, da branca até a marrom) e Dans (do 1º ao 10º grau para os faixas pretas) similar ao que era usado no Judô. Também foram adotados novos métodos de treinamento, os katas foram revisados e muitos deixaram de ser praticados, o karatê passou por uma reavaliação, deixando em segundo plano a sua origem guerreira para se tornar um esporte onde pessoas de todas as idades e classes sociais pudessem praticá-lo sem correr riscos à sua integridade física. No ano de 1933, o Dai Nippon Butokukai, órgão japonês encarregado das artes marciais, reconheceu oficialmente o Karate-Do como Arte Marcial.

sexta-feira, 18 de março de 2011

A história das artes marciais e o surgimento do Karatê

A necessidade de defender-se para sobreviver fez com que o homem desenvolvesse diversos gêneros de luta, em diferentes épocas e regiões do mundo. No entanto, um momento e uma região, em especial, marcaram historicamente as artes marciais.
Em meados do século V, Bodhidarma, monge indiano, caminhou para a China a fim de fundar um mosteiro budista. Seguidor do budismo de contemplação, ele desenvolveu técnicas de luta sem armas chamadas Shao-lin-su-kempo. O objetivo era a manutenção da saúde e a auto defesa em que, através de exercícios penosos, pretendiam o fortalecimento do corpo para dar morada a paz de espírito e a verdade religiosa. Essas técnicas foram difundidas pelo território chines.
O intercâmbio comercial e cultural entre a China e as ilhas vizinhas, possibilitou, especialmente em Okinawa, que na época pertencia à China, a introdução das técnicas de lutas chinesas. Ao final, da dinastia Ming, Okinawa passou ao domínio japonês que para evitar a reação do povo nativo, proibiu uso de armas. Sob pressão militar, a população obteve nos utensílios de uso cotidiano e no próprio corpo, como cadeiras, cordas, mãos, joelhos e etc., meios de defesa. Esses utensílios e corpo se transformaram em armas (Nakayama, 1987).
O isolamento japonês no período medieval, nos séculos IX a XIX, contribuiu para que o povo nativo criasse um estilo próprio de luta, diferente de sua origem chinesa. A perseguição exercida pela classe dominante japonesa era tal, que Okinawa (1885) chegou a compará-la a perseguição sofrida pela capoeira no Brasil Imperial.
No inicio do século XIX, com a ruptura do isolamento japonês, surgiram as armas de fogo, inibindo a utilização das lutas de corpo a corpo que quase desapareceram como arte de guerra. O século XX trouxe consigo o ressurgir das artes marciais, deslocando o enfoque de luta para a sobrevivência, para educação física, com fundamentação espiritual.
Considerado o pai do Karate-do moderno, Funakoshi modificou o karate literal e filosoficamente de "Mãos Chinesas" para "Mãos Vazias", mãos de liberdade, em que KARA e TE passaram a ter a conotação de defender-se desarmado e ter a mente livre do egoísmo e da maldade. O karate passou a representar a busca de um caminho (DO) ou disciplina a ser seguida por toda a vida, na construção da personalidade (Nakayama, 1987; Silvares, 1987) dos seus praticantes, fossem novos ou velhos, doentes ou saudáveis.
Cada geração, cada grupo cultural e o estudo científico pelos quais passou, participaram do processo de construção do Karate-do, transformando-o na arte que conhecemos hoje, com uma característica mais esportiva, cujo objetivo maior é que os efeitos da prática transcendam os limites do dojo (sala de treinamento), formando o indivíduo saudável, humilde, cortês, crítico, justo e corajoso, capaz de perceber os fatos e agir objetiva e equilibradamente nas variadas situações da vida. 

quinta-feira, 17 de março de 2011

Dúvidas e esclarecimentos

            Algumas pessoas me pediram para que eu voltasse a escrever, publicasse minhas ideias. Como não atender ao pedido de minha mãe e minha esposa (autoras do pedido), minhas leitoras fieis e favoritas.

            Aí fiquei pensando: vou falar de que neste primeiro post? Pensei em várias coisas: pensei no flamengo! Sou rubro-negro apaixonado, o clube está invicto... mas todo mundo fala do flamengo. Este não seria o melhor momento para colocar no ar apenas mais um texto de um flamenguista fanático.

            Pensei em falar de religião! Mas do que eu falaria? Iria fazer um ctrl+c e ctrl+v em algum texto de alguém com mais sabedoria e estudo? Não. Farei isso com certeza (citando a fonte, claro), mas ainda não é o momento, afinal minhas duas leitoras não queriam ler as minhas considerações, dúvidas ou incertezas neste primeiro texto.

            Cogitei falar dos acontecimentos recentes no Japão. Mais uma vez, seria um trabalho de recorta e cola dos mais variados sites da internet, já que eu não conheço o país pessoalmente (algo que vou providenciar assim que possível).

            Falarei, então, de Karatê. Afinal, pratico esta arte marcial há 22 anos, tenho alguns alunos, conheço algumas coisas. Entretanto, este também não é o momento. Ainda tenho muito o que aprender e poderia soar de forma errônea, soberba, ou algo do tipo.

            Política também passou pela minha cabeça. Falar dos primeiros meses do governo Dilma, dos seus “desencontros” com o PT. Falar do Itamar Franco, Aécio Neves e de outros senadores, bem como de deputados como Antônio Carlos Magalhães Neto, Romário ou o Tiririca. Mas acreditei ser melhor dar tempo aos nossos representantes, para que possamos apresentar um conceito mais maduro.

Depois de tanto pensar no tema, comecei a entender que eu precisava de uma série de respostas em minha vida, antes de emitir qualquer opinião sobre qualquer assunto. E, só desta forma, percebi que são muitas as possibilidades de texto, mas que, neste primeiro momento, é melhor deixar claro que não somos os donos da verdade. Estamos aqui para contribuir com o crescimento de todos, mas não criar paradigmas ou estereótipos de tal maneira a manipular o pensamento da população.

Pensemos antes de escrever, jornalistas são formadores de opinião e, por mais que tenhamos somente dois leitores, faremos alguém pensar no conteúdo escrito.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Sejam bem vindos

Sejam todos bem vindos.
Aqui vou tentar expressar algumas ideias, sobre vários assuntos. Falaremos de tudo por aqui: profissão, Karatê, política, comunicação, cotidiano, enfim...
Este será o espaço dedicado a aqueles que sempre tem uma opinião que diverge da maioria, até por que "toda unanimidade é burra".
Vamos lá... mãos à obra.