sexta-feira, 1 de junho de 2012
Definições do Karatê
Há muita gente capaz de definir "karate" melhor que este autor. Isto é, deve haver. Uma vez que definir é apenas explicar o que significa uma determinada palavra. Por este motivo, vamos apenas emitir uma definição simples: "karate" é uma luta corporal sem armas, baseada em técnicas definidas de ataque e defesa.
Entretanto, não é a definição que nos interessa no momento, e sim, o conceito de "karate". E conceito é a explicação detalhada e sem dúvidas, capaz de dizer o que uma palavra quer expressar em um dado idioma. _ Ou seja: enquanto a definição diz o que uma palavra é, o conceito a demonstra.
E por isso, um conceito precisa ser completo, sem ser prolixo, mas sem deixar margem capaz de confundir uma palavra com outra semelhante, isto é, deve demarcar os limites semânticos entre uma palavra e outra.
Toda esta discussão inicial se faz necessária porque o termo em estudo não tem etimologia em nosso idioma, o português, ela é encontrada no idioma japonês. E por esse motivo nós a estivemos escrevendo entre aspas, mas a partir deste ponto vamos escrevê-la normalmente, sem aspas. O seu homônimo português seria a palavra "caratê", entretanto, esta palavra seria apenas a grafia do som da pronúncia japonesa e não daria a dimensão exata do que é karate. Karate não é uma palavra, mas sim expressão idiomática japonesa que significa "mãos vazias", e não pode ser traduzida para o nosso idioma uma vez que sua grafia é feita em "kanji" (pronuncia-se candí) e, o kanji não se traduz, apenas se interpreta. - O kanji é uma escrita em ideogramas (sinais que exprimem a idéia e não os sons das palavras que representam essa idéia) de origem chinesa e que o povo japonês adotou como linguagem escrita (primeiros séculos de nossa Era) através do povo coreano, que mais tarde deu origem aos "kana" (não se pluraliza na escrita japonesa): o "hiragana" e o "katakana".
Após esta rápida explicação, passemos ao motivo deste texto: _ O QUE É KARATE.
_ Desde que o mundo é mundo, que o homem luta por sua sobrevivência. No princípio por instinto de preservação (o combate); mais tarde para ter domínio sobre outros homens (a técnica); depois para aperfeiçoar e conservar a técnica e poder ensiná-la (a arte); depois por diversão e culto da vaidade (o esporte) e; por fim para explicar a si próprio o porquê da luta pela sobrevivência ou pela vaidade (a filosofia). Tudo isso pode ser englobado numa só expressão: luta. E é desta luta que trata o karate.
Em japonês tudo que se relaciona com luta entre oponentes capazes de tomarem consciência de seus atos, tem-se a tendência de chamar de karate. Mas para que seja assim classificada uma luta tem que apresentar certas características, como por exemplo: não se valer de armas artificiais, isto é, instrumentos que foram criados com esse objetivo: servir como armas. Mas porque dizer armas artificiais? Porque no karate usamos nosso corpo como arma. Fazemos todo um treinamento específico para tornar cada parte de nosso corpo um instrumento de ataque e defesa. Mas não é só o corpo que pode ser usado. Qualquer objeto natural pode ser utilizado num combate de karate: uma pedra, um pedaço de pau, areia, etc., deste que em estado natural, isto é, não seja uma arma por definição. - Mas isto é um combate como outro qualquer, e não pode ser chamado de karate se não tiver dois constituintes específicos: a técnica e a filosofia. - A TÉCNICA dá ao homem a certeza dos resultados e diferencia o seu combate de uma briga-de-rua, onde vence o mais forte, o mais violento ou o mais astuto. Na técnica há a diminuição do esforço, do desgaste físico, dos traumas, da incerteza do resultado dos golpes aplicados, com o aumento da potência dos golpes, do controle, da tranqüilidade e domínio sobre o oponente. _ A FILOSOFIA dá os motivos para o combate, explica as razões do oponente, avalia as possibilidades da vitória e da derrota, ou seja, diz ao homem o porquê do combate. A fusão dos dois nos dá a ARTE: o domínio sobre a técnica, a execução perfeita dos ataques e das defesas, o controle sobre a mente e a segurança necessária para avaliar o combate enquanto ele se desenvolve (como um pintor avalia seu trabalho enquanto o produz e antes de concluí-lo).
O karate é classificado como arte marcial. Mas não se deve pegar o dicionário e usar a primeira definição que lá aparece. Não! Devemos procurar a que melhor se adequa ao conceito: com aspecto de guerreiro. Guerreiro japonês: altivo, imponente, confiante e despretensioso.
_ O karate nasceu na pré-história, com a necessidade da sobrevivência do homem. Claro que não se chamava karate. Karate é um termo, recente, criado no começo do século XX. Mas antes de explicar a origem do termo, vamos à origem da luta: _ segundo os místicos, na antiga Atlântida já se praticava uma espécie de luta com características semelhante às do karate original (não o praticado hoje) e que antes do seu afundamento um grande mestre dessa luta foi enviado para o continente asiático para preservá-la e ensiná-la. O local escolhido foi a Índia, onde foi ensinada às castas guerreiras e nobres com o nome de VAJRAMUSHTI (Sânscrito _ punho real ou punho direto) e tinha como objetivo a defesa pessoal, a saúde física e o despertar espiritual. Conta-se que SAKYAMUNI, o BUDA, o aprendeu quando príncipe, como parte de sua educação e que mais tarde o introduziu como prática ascética no ensinamento da sua doutrina. Quase mil anos após Buda, o 28º Patriarca budista, BODHIDHARMA, mestre em Vajramushti, viajou para a CHINA no intuito de explicar sua doutrina do budismo a monges que iniciavam um movimento inovador, com características diversas do budismo original. Não tendo obtido sucesso por interferência do Imperador Wu Ti, Bodhidharma viajou de sua corte para o reinado de Wei, onde se hospedou num templo chamado SHAOLIN, numa província hoje chamada Hunan. Ali Bodhidharma converteu os monges taoístas ao budismo e passou a ensinar a doutrina da meditação (Ch\"An, em chinês; Zen, em japonês) juntamente com Vajramushti.
Havia na China uma luta muita antiga conhecida então como Kempo, e por isso o Vajramushti quando passou a ser ensinado ao povo, por motivo de resistência ao domínio de invasores chamou-se SHAOLIN-SZU KEMPO (em chinês) ou SHORINJI- KEMPO (em japonês), ou "o punho direto do Templo da Jovem Floresta". E foi com esse nome que ele chegou às Ilhas RYUKYU, no Japão, alguns séculos atrás, através de alguns chineses.
Das Ilhas RYUKYU a maior é OKINAWA, aonde chegaram as primeiras noções do KEMPO de SHAOLIN. Tendo sofrido várias adaptações ao povo de Okinawa, o Shorinji-Kempo perdeu suas características chinesas sendo reconhecido então, como uma arte marcial própria de Okinawa, passando a se chamar de OKINAWA-TE.
Devido à proximidade de Okinawa com a China, havia um certo intercâmbio entre seus habitantes, de modo que muitos "experts" viajavam entre as duas localidades, tendo contribuído bastante para o desenvolvimento do atual karate. Como exemplo cita-se um certo SAKUGAWA de Akata, em Shuri, que cerca de duzentos anos atrás viajou para a China e quando retornou para Okinawa, conforme ensinava "karate" (mãos da China), passou a ser conhecido como "Karate Sakugawa" durante seu tempo. Cerca de cento e quarenta anos atrás chegou a Okinawa um "expert" chinês chamado KU SHANKU com alguns de seus alunos e introduziu um tipo de kempo. Alguns "experts" de Okinawa, tais como SAKIYAMA, GUSHI e TOMOYORI, de NAHA (cidade da Ilha de Okinawa), estudaram com um adido militar chinês chamado ASON; MATSUMURA, de SHURI (outra cidade de Okinawa) e MAESATO e KOGUSUKU, de KUME (outra cidade, também de Okinawa), com o adido militar IWAH; e SHIMABUKU, de UEMONDEN, e HIGA, SENAHA, GUSHI, NAGAHAMA, ARAGAKI, HIJAUNNA e KUWAE, todos de KUNENBOYA, com o adido militar WAISHIZAN. Afirma-se que um professor de GUSUKUMA, KANAGUSUKU, MATSUMURA, OYATOMARI, YAMADA, NAKAZATO, YAMAZATO e TOGUCHI (todos de TOMARI) foi um chinês sulista que foi arrastado até Okinawa.
Alguns grandes mestres foram formados nessa época, dentre os quais GUSUKUMA e MATSUMURA, que aprenderam com WAISHINZAN. AZATO, que aprendeu com MATSUMURA e ITOSU que aprendeu com GUSUKUMA. De AZATO e ITOSU aprendeu o Mestre GICHIN FUNAKOSHI, já na virada do século XIX para o século XX. FUNAKOSHI aprendeu KEMPO chinês em duas formas, das Escolas SHOREI e SHORIN, das quais desenvolveu sua própria forma de KEMPO. Mas o OKINAWA-TE (MÃOS DE OKINAWA, que já existia em OKINAWA), e que Funakoshi conhecia bem, influenciou, sem dúvida, o seu trabalho e seu desenvolvimento nas artes marciais.
GICHIN FUNAKOSHI (nasceu em 1868 em SHURI, Prefeitura de OKINAWA e morreu em 26/04/1957 em TOKYO) é considerado o PAI do karate. Se não o pai gerador, pelo menos o pai adotivo aquele que criou (adotou) o karate e deu-lhe as condições de tornar-se adulto num mundo onde já havia tantas artes marciais. Foi ele o primeiro praticante da arte marcial de Okinawa a se preocupar com o desenvolvimento e a propagação de sua técnica e ao mesmo tempo fazer dela uma arte voltada para a formação do caráter e do espírito de seus praticantes. Foi ele que, sendo um mestre-escola (professor primário), teve a intuição de criar um termo específico para sua já antiga arte de lutar, então conhecida como RYUKYU KEMPO. Num trabalho difícil e demorado, o grande Mestre montou toda a estrutura do que é hoje o moderno karate, dando-lhe as técnicas definidas, as formas de treinamento, a teoria e a filosofia, bem como um nome: KARATE-DO. _ Havia um ideograma chinês para a palavra "kara" (), mas que Funakoshi não achou adequado para expressar o vazio espiritual que ele queria no significado de sua arte, que ele queria chamar de "Karate-Do", isso porque Sakugawa já usara o nome karate na forma chinesa, mas que significava apenas "mãos da China" em japonês. Daí, Mestre Funakoshi introduziu na palavra karate, em substituição ao ideograma chinês (), o ideograma "kara" (), que passamos a interpretar.
O SIGNIFICADO DE KARATE-DO (***)
Numa tradução simplificada "karate-do" significa "caminho das mãos vazias". "Do" significa "caminho espiritual, a busca interior do homem".
"Te" significa "mão", "ou a instrução física usada na busca do vazio espiritual". Já o termo "kara" tem um significado mais amplo, como veremos:
_ A primeira conotação de kara () indica que karate é a técnica que permite que alguém se defenda com as mãos limpas e punhos sem armas.
_ Em segunda conotação, exatamente como é o espelho limpo que reflete sem distorção ou um vale quieto que ecoa um som, assim deve ser aquele que estuda Karate-Do: purga a si próprio do egoísmo e da maldade completamente, pois só com uma mente clara e uma consciência limpa pode ele entender aquilo que procura. Este é outro significado do elemento "kara" no Karate-Do.
_ Em seguida, aquele que estuda Karate-Do deve sempre empenhar-se para ser interiormente humilde e externamente nobre. Entretanto, uma vez que ele tenha decidido a lutar pela causa da justiça, então deve ter a coragem como expressa no provérbio, "Mesmo que ele seja dez milhões de inimigos, eu vou". Assim, ele é igual ao talo do bambu verde: oco (kara) por dentro, reto e com nós, isto é, sem egoísmo, nobre e moderado. Este significado está também contido no elemento "kara" de Karate-Do (em japonês o vazio indica sem egoísmo; a retidão, obediência e nobreza; e os nós, força de caráter e moderação).
_ Finalmente, em um caminho fundamental, a forma do universo é o vácuo (kara), e, assim, vácuo é sua própria forma. Há muitas espécies de artes marciais: judo, kendo, sojitsu, bojitsu e outras, mas num nível fundamental todas estas artes apóiam-se sobre a mesma bases que o Karate-Do. Não é exagero dizer que o senso original do Karate-Do é uno com as bases de todas as artes marciais. A forma é o vazio e o vazio é sua própria forma. O "kara" do Karate-Do tem este significado.